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Pentax de família com o espelho quebrado
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Miniatura

Título
Pentax de família com o espelho quebrado
Narrativa
"Essa câmera poderia me lembrar apenas da sua história anterior a mim, que eu já gosto muito, mas ela me leva para mais lugares. A história anterior tem a ver com o primeiro curso de fotografia que a minha tia mais nova fez. Ela me usava de cobaia aos três anos de idade para praticar, tenho uma ótima coleção de fotos que vai de careta fofinha com batom por toda a cara, a 37 flores no cabelo, e emburrada com vestido de festa na grama do parque. Nossa família também tem registros muito bonitos por causa dela. A câmera a acompanhou na carreira como fotógrafa por talvez uma década, até ela trocar por um modelo digital. Penso o tanto de histórias, de pessoas que não faço ideia, que ficaram registradas nos rolos de filme que passaram por ela. Eu a ganhei de presente 15 anos depois, quando passei no vestibular para artes plásticas. E aí começa a história dela em minhas mãos. Eu tenho um lugar preferido no mundo, bem clichê na maravilhosa Bahia, quem me conhece sabe. Um lugar mágico onde a dor que eu sinto constantemente no pé direito desaparece. Eu cheguei nessa ilha pela primeira vez, nas minhas primeiras férias de faculdade. Nessa época que a gente ainda é super bocó sobre a gente mesmo, ir para lá sem nenhuma das minhas amigas, como era o plano inicial, pareceu um grande desafio. Lembro que eu cheguei, deixei a mochila no lugar que ia ficar pela próxima semana, peguei a câmera, pendurei sua alça no ombro, apoiei a mão no corpo dela como se fosse uma bolsa, mais para ter o que fazer com as mãos, e parecer que eu estava mega à vontade andando sozinha por um lugar que eu não conhecia ninguém. Andei sem pressa por horas, sem mapa, sem perguntar informação, sem ouvir música ou podcast (naquela época não tinha sinal de celular ainda e orelhões ainda existiam) enfim, sozinha a câmera e eu. Eu olhava as coisas com calma, para conhecer, encontrar beleza, poesia, ou piada e aí eu escolhia algumas cenas e fotografava, filme né, poucas chances, faça suas escolhas. Vou procurar essas fotos, mas se não me falha a memória elas ficaram horríveis em sua maioria. Eu não tinha aprendido a configurar todos os ajustes ainda. Fato importante é, o péssimo resultado das fotos não foi problema pra mim, porque essa máquina, coisa, treco, objeto, me fez companhia num dos acontecimentos mais
importantes da minha vida. 1 eu aprendi que amar viajar sozinha faz parte de quem eu sou e 2 ficar em paz com a gente mesmo é uma das lições iniciais sobre amor próprio,
liçãozinha precisada naquele verão. ps. Ela está sem funcionar, quebrou o espelho e na minha cidade não tem essa peça disponível para trocar. Ano passado, na última viagem que fiz a São Paulo, fui até a rua 7 de Abril, nº 261, com o gps ligado e pedindo informação, mas o senhorzinho que trabalha com reparos em Pentax não estava, “alguns dias ele decide não vir trabalhar” era manhã de segunda-feira, meu último dia na cidade. Mas tudo bem, foi numa época da minha vida que tudo parecia estar dando errado, e até nesse dia que eu não conseguia enxergar beleza em nada ela me fez companhia."
Descrição da Imagem
Câmera fotográfica antológica. Possui a caixa e a corda de segurança na cor preta. Possui na parte superior central o flash, e logo a baixo a lente no centro em um tubo cilíndrico. Possui a seguinte inscrição na cor branca na parte de proteção da corda de segurança "PENTAX".
Doador
Nathália Vargas