Narrativa
A vovó Geni, minha avó paterna, foi uma pessoa extremamente presente na minha vida. Fez parte da minha formação como pessoa e mulher, a partir de uma simplicidade e singularidade surreal. Foi nossa vizinha em todo o tempo que estive no Rio Grande do Sul, onde nasci e morei por 18 anos. Sua casa cheirava a café recém passado, e trazia no ar conforme você ia andando, um cheiro doce de talco. Por ser minha vizinha, era diária nossa convivência, onde ela sempre preparava uma torrada com salaminhos e queijo, e passava um bom café, de modo mais suave, que era o que ela gostava. Vovó Geni era quietinha e observadora, gostava muito de acompanhar a política no país, e votou a vida toda. Analfabeta, sabia somente assinar seu nome, fazia crochês da linha fininha e todo aniversário de alguma das netas ou bisnetas dava uma de suas obras juntamente com uma nota de R$10,00. Todas temos os enxovais guardados e ainda com o cheiro dela. Vovó morreu em dezembro de2007, aos 89 anos de idade, e foi um dos lutos mais dolorosos que já vivi. Uma das memórias físicas que vovó deixou para mim foi uma lata prateada, toda cheia de detalhes,e que dentro tinha uma conchinha solitária e de formato bem diferente do comum. Desde pequena sempre mexia nessa caixinha e tentava entender aquela concha toda disforme. Talvez ali tenha começado meu interesse na arte e na vida pelo incomum. Quando recebi a lata pelas mãos de meu pai, senti que ali seria o local perfeito para uma coleção de conchas, então assim começou essa forma de hobby que traz a minha avó a cada conchinha colocada lá dentro da lata.